O termo átrio, do latim atrium, é de derivação etrusca. Nas casas romanas indicava o pátio interno que era parcialmente coberto. Se trata de um pátio quadripórtico de frente para o ingresso.
Nas basílicas paleocristãs se encontrava inserido na fachada da igreja, sendo mediado algumas vezes peloNartex. No centro deste pátio, geralmente, era colocada uma fonte, denominada cantharus.
O cantharus recorda por sua vez o impluvium encontrado nas casas romanas; uma espécie de tanque retangular com o fundo plano que era usado para recolher água da chuva.
Como tudo o que é utilizado pela arte e arquitetura litúrgicas, não é por caso, uma vez que se trata sempre da manifestação de uma imagem, também o cantharus desenvolvia uma função na antiguidade que estava vinculada à Sagrada Liturgia, ou melhor, para a preparação na participação desta. Se trata do rito de ablução presente em muitas religiões, entre as quais se encontra o judaísmo, o cristianismo e o islamismo.
No cristianismo antigo, havia o banho de catecúmenos na semana santa, antes do batismo, enquanto, na Idade Média, permaneceu o uso de lavar a cabeça no Domingo de Ramos e a lavagem das mãos no cantharus, antes de entrar na igreja. Atualmente, na liturgia católica, o rito da ablução permanece na aspersão dos fiéis com água benta, sobretudo, nos domingos após a Páscoa, como recordação do Banho batismal, que nos purifica dos pecados, e a lavagem das mãos do padre, antes de iniciar o rito de consagração dos dons do pão e do vinho, na celebração eucarística.
Em Roma no átrio da Basílica de São Paulo fora dos muros, havia uma inscrição de São Leão Magno que avisava aos fiéis a sua função: “ablue fonte manus”. Simbolicamente, o cantharus invoca o vaso no qual, à semelhança das pombas que saciam sua sede, as almas dos fiéis tiram dele água e se regeneram.
Mausoléu de Galla Placidia- Ravenna (Sec. V)
Ocasionalmente, podemos encontrá-lo em grandes construções, por exemplo, em Roma, na Basílica de São Clemente, em Milão, na Basílica de Santo Ambrósio, entre outras.
Basílica de São Clemente em Roma
Basílica de Santo Ambrósio
Nos mosteiros, sobretudo, o átrio se tornou muito comum, sendo pouco a pouco reduzido à função de claustro. Neste sentido, sua função externa de acolher os peregrinos, como também o lugar do exercício da caridade, cede lugar no interno dos mosteiros, além de ser um local de passagem à convivência e recreação e, por vezes, lugar onde se colocavam as tumbas de benfeitores e membros da comunidade monástica.
Mosteiro de Pietra
Mosteiro dos Beneditinos: o Claustro dos Mármores
No que diz respeito à sua forma e simbologia, o átrio evoca a Cidade quadrada e universal, a Jerusalém Celeste (Ap 21, 2), cujo supremo construtor é Deus mesmo. De fato, a planta ad quadratum (Ap 21, 16) se relaciona ao princípio da arquitetura dos templos, a quadratura do círculo, onde os quatro ângulos se referem aos quatro elementos que compõem a terra, uma representação espiritualizada dos quatro reinos da natureza, ou seja, a integração simbólica das diversas criaturas no microcosmo, que no plano da liturgia cristã que assume e consagra no pão e no vinho, frutos da terra e do trabalho humano, toda a criação manifestando, deste modo, o macrocosmo, que se torna meio de comunhão com Deus e os irmãos. Deste modo, não é de se estranhar que o espaço interno do átrio, cultivado como jardim é também chamado de Paradisus.
É interessante notar que o átrio e, posteriormente, o seu desenvolvimento, o claustro sempre foram um local de passagem. Mas, de modo especial, o claustro, enquanto solução arquitetônica simples, que vincula todos os espaços e assegura a circulação entre os ambientes. Se tornando deste modo um lugar de encontros e de passagens que no afã das atividades do dia a dia passam despercebidas, uma vez que cada ambiente insere a pessoa em uma função, seja ela administrativa, recreativa, cultural ou simplesmente a do repouso.
Todas elas contribuem para uma existência consciente, e todas encontram o seu máximo sentido na igreja ou capela, que, embora esteja descentrada do espaço, é o centro vital dos monges que ali habitavam. A capela desenvolve um papel de unificação e de coordenação dos vários edifícios por meio do claustro, este por sua simbologia ajuda a passar no que tange ao tempo, do cronos ao kairós, da dimensão meramente humana àquela da divina-humanidade de Cristo.
É o que podemos perceber nas construções religiosas contemporâneas como o Convivium Emmaus, espaço formativo dos futuros presbíteros da Arquidiocese de Belo Horizonte, que contempla a arquitetura dos edifícios dos grandes centros urbanos, sem perder o vínculo com a tradição arquitetônica litúrgica do cristianismo.
Pe. Mateus Lopes
Detalhe da Fonte - Claustro Convivium Emmaus
Claustro do Convivium Emmaus – vista para a Capela
Bibliografia
Testini, P. Archeologia Cristiana, Puglia, 1980.
Champeaux, G. Sterrck, S. Le monde des Symboles Zodiaque, St. Léger Vauban, 1972.
Ghisu, C. Atrio, 178-179 in Cassanelli, R. Guerriero, E. Dizionario san Paolo di Iconografia e Arte cristiana, vol I, Milano 2004.
Barral I Altet, X. Contro l’arte romanica? Saggio su un passato reiventato. Milano 2008.
Fotos
Foto 1 Pag 1 - La Basilica paleo cristiana: Pinterest
Foto 2 Pag 2 - Mausoléu de Galla Placidia: https://www.ravennamosaici.it/gallery/?_gl=1*1o16vua*up*MQ..&gclid=CjwKCAjwjqWzBhAqEiwAQmtgT_dBFEyfiZXIiNIhquNNsdkMitcVmwJ5fY15i1mF92pA0KIUCnNbxoCkGMQAvD_BwE#iLightbox[gallery_image_1]/9
Foto 3 Pag 2 - Basílica de São Clemente em Roma: Pinterest
Foto 4 Pag 3 - Basílica de Santo Ambrósio em Milão: Pinterest
Foto 5 Pag 3 - Mosteiro de Pietra: Pinterest
Foto 6 Pag 4 - Mosteiro dos Beneditinos, o Claustro dos Mármores: https://www.monasterodeibenedettini.it/en/contacts-and-info/
Foto 7 Pag 5 - Convivium Emmaus: https://radioamerica.arquidiocesebh.org.br/noticia/convivium-emaus-espaco-de-espiritualidade-saude-e-formacao-de-jovens-dedicados-ao-sacerdocio/
Fotos 8, 9, 10 Pag 5 - Convivium Emmaus: Seminarista Charlys Heverton
Fotos 11, 12 Pag 6 - Convivium Emmaus: Seminarista Charlys Heverton
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