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Pentecostes: O amor que acolhe e se manifesta na diversidade



   A Festa de Pentecostes era conhecida como “festa das colheitas”, uma origem estritamente agrícola, mas no século II a.C adquiriu um sentindo histórico-salvífico sendo assim, assumida pela Sinagoga, como uma memória da Aliança feita no Monte Sinai. Os primeiros cristãos não guardaram as memórias judaicas, porque fizeram a sua própria experiência de Pentecostes:a descida do Espírito Santo cinquenta dias após a Páscoa. 
  Este evento marcou o início de sua ação evangelizadora.
Sabemos pelo diário de Egéria, peregrina em Jerusalém, que Pentecostes era celebrada juntamente com a Ascensão do Senhor, uma única solenidade, porém, na segunda metade do século IV d.C a festa sofreu algumas modificações, separando-a em duas solenidades,devido à concepção cronológica dos eventos salvíficos cumpridos por Jesus Cristo.
     A iconografia da Festa de Pentecostes embora constante, sofreu algumas alterações significativas, a maior delasdiz respeito à presença da Mãe de Deus. Sua presença neste ícone é antiga como nos testemunha o Código de Rabulla de 587, depois, é retomada no final doséculo XVI. De fato, a presença da Mãe de Deus na iconografia de Pentecostes, seja bizantina, como ocidental permaneceu ausente por muito tempo. As explicações para tal ausência são simples:

1)    Bíblica: Os textos bíblicos não oferecem indicações claras e pontuais da presença e do papel da Mãe de Deus no momento da descida do Espírito Santo.
2)    Teológica: Maria concebeu do Espírito Santo, logo era plena da sua presença.

Porém, posteriormente reintroduzida a sua presença na iconografia de Pentecostes, pelo Ocidente e por algumas linhas iconográficas orientais bizantinas, trouxe um novo significado para o ícone, além de um crescimento maiordo culto mariano.
    Como sabemos, a tradição sempre viu na figura de Maria, a imagem da Igreja, por isso ela se tornou Mãe da Igreja. Em Maria vemos a imagem da nova humanidade já em sua plenitude, realizada, em plena comunhão com Deus.
Essa realidade nos ajuda como cristãos a vivermos de modo eclesial a Solenidade de Pentecostes. Não somente como uma recordação da vinda do Espírito Santo no passado, mas comoatualização deste evento no hoje da nossa história como homens e mulheres da Igreja.
     A Solenidade de Pentecostes não se trata simplesmente da descida do Espírito Santo em línguas de fogo e basta, este evento que ecoa até os nossos dias, tem como único objetivo, ensinar a nós cristãos a linguagem do amor, que é capaz de acolher a diversidade, sem a qual não pode existir verdadeira comunhão. Pois o Deus que acreditamos só é uno porque acolhe dentro de si a diversidade, a alteridade das Três pessoas divinas. O Pai não é o Filho, o Filho não é o Pai, o Espírito não é o Pai nem o Filho, mas são um único Deus. Comunhão não quer dizer igualdade, porque tudo o que é igual gera morte, anula a liberdade. Comunhão é acolhida da alteridade no amor.
     
Centro Aletti-lSantuário Nacional de
 S. João Paulo II -Washington
O capítulo 11 do livro do Gênesis nos narra a construção da Torre de Babel. Os homens queriam construir uma torre que alcançasse os céus, para dominar sobre todas as nações, fazendo-as um único povo, com uma única língua, ou seja, a eliminação da diversidade. Quando não existe diversidade, diferença, o que resta é somente a morte. A igualdade ideológica apaga o rosto porque anula a identidade, anula a pessoa. 
      Por isso, diante da prepotência daqueles homens de quererem adentrar os céus, os mistérios divinos, Deus confunde a linguagem deles, externalizando aquilo que já estava dentro deles, de modo que eles não se entendiam entre si, porque todas as vezes que o ser humano procura ocupar o lugar de seu Criador, uma babel nasce no seu interior. Aonde existe uma babel, impera a confusão, falta a harmonia, a clareza e o discernimento do Espírito.
    De outro modo, depois da Páscoa de Cristo e da ascensão da nossa natureza humana aos Céus, Ele nos envia o Espírito do Pai, para que como homens e mulheres da Nova Criação, homens e mulheres do “Oitavo dia”, o anúncio de sua presença salvífica no mundo, seja feito somente a partir de uma única linguagem, aquela do amor, porque Deus é amor.
    Em tempos como os nossos em que o egocentrismo se tornou norma de vida, o sentido eclesial parece enfraquecido, muitos gritam eu sou de Paulo, eu sou de Apolo, mas esquecemos de gritar Cristo com a nossa vida,como dizia o Beato Charles de Foucault. Não importa o caminho eclesial que escolho para anunciar Cristo, pode ser o mais radical como a caridade e dedicação total aos mais pobres, a luta pela justiça daqueles que são marginalizados, o caminho espiritual deste ou daquele movimento, mas se não é impulsionado pelo amor, não serve para nada, não gera frutos porque não transmite a Vida de Deus. Gera somente confusão porque alicerçado na natureza humana que quer e luta para aparecer a todo instante.
Centro Aletti
Capella della sede episcopale
Tenerif
     Como vemos no mosaico de Pentecostes, os apóstolos olham em direções diversas. Do mesmo modo, nós somos chamados a olhar, não em uma mesma e única direção, mas em todas as direções porque em todas elas existe alguém sentado nas periferias da vida esperando a mensagem da Boa Nova, Cristo Jesus, aquele que comunica vida em plenitude.
     Nesse sentido, Pentecostes não é agitação eclesial e social, Pentecostes é sim um agir transformador impulsionado primeiro pelo Amor que tudo o que toca transforma, porque o Espírito é fogo, “é chama que crepita, é aquele que dobra o que é duro, que guia no escuro, que no calor é aragem”, por isso é capaz de nos fazer sair das trevas para a luz, da prisão para a liberdade, do medo à coragem, não pela força, mas pela criatividade do amor, própria daqueles e daquelas que se deixam tocar e guiar por Deus.
     Se reduzirmos Pentecostes apenas a uma agitação eclesial e social alicerçada em interesses outros, do que aquele de salvar a pessoa humana inteira e todo o ser humano, como alguns querem hoje afirmar, corremos o risco de rasgar a túnica de Cristo que é a Igreja. Corremos o risco de esquecer que aquele que se tornou centro da História, morreu na condição ignominiosa da Cruz, aparentemente fracassado porque o amor cristão não se impõe, o amor cristão é doação que se dáno esvaziamento de si.
     Que Deus nos ajude a viver bem a Solenidade de Pentecostes com a consciência Eclesial de que somos filhos da Igreja, portanto, responsáveis no mundo de testemunharmos em nossas vidas a sua Luz, que não pode e nem deve ser outra, senão aquela de seu Senhor e mestre Cristo Jesus, o Vivente. 
             Pe. Mateus Lopes.
       



     

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